domingo, 16 de agosto de 2009

Genealogia e verdade, para Foucault



















Vejam:

O rosto que se desvanece na beira da praia: homem, conhecimento e direito em Michel Foucault
Autor: Felipe Dutra Asensi

http://www.urutagua.uem.br/009/09asensi.pdf

e

Foucault: uma história crítica da verdade

Autor: Cesar Candiotto

http://www.scielo.br/pdf/trans/v29n2/v29n2a06.pdf


Crédito imagens:

Olho: http://anarkaos.files.wordpress.com/2009/07/olho.jpg

Em busca da verdade: http://embuscadaverdade.blogger.com.br/verdade.jpg

Verdade ou mentira: http://www.nomeimproprio.com.br/wp-content/uploads/2009/04/verdade-mentira.jpg

Mentira: http://sempretensaoii.zip.net/images/Mentira.jpg

sexta-feira, 14 de agosto de 2009

Psiquiatria e poder

Todos gostamos de ver coisas bonitas quando o assunto é Educação. O vídeo O Poder Psiquiátrico não fala de coisas bonitas, mas é importante ver. Porque ele nos mostra o que somos capazes de fazer quando nos sentimos autorizados pelo nosso saber. E que o nosso saber pode ser violência.
O vídeo foi elaborado a partir de conferências realizadas na UFMT.
Vale a pena pensar no nosso cotidiano e perguntar se sob a nossa docilidade e sabedoria também não há violência, em especial na Educação. Por que queremos tanto disciplinar, docilizar? Estamos conseguindo isso? O feitiço não terá se virado contra o feiticeiro?

Relação entre o pensamento de Foucault e a Educação

Neste vídeo, os palestrantes expõem sua opinião sobre a conexão que fazem entre o pensamento de Foucault - especilmente quanto à questão do poder/liberdade - e a Educação.

É importante fazer uma distinção entre liberdade/autoritarismo e liberdade/autoridade. Ultimamente isto anda muito confuso, o que para mim é um paradoxo: nós questionamos a autoridade mas convivemos com o autoritarismo (das instituições, das pessoas) e com uma violência absurda, generalizada e naturalizada. Não será a falta de uma a causa da outra? Ou seja, a falta de autoridade, a sua negação (por medo, covardia ou vergonha) não impulsionaria o autoritarismo? Uma criança deveria ter autoridade ao reivindicar o respeito de si. O professor também, ao relacionar-se com a criança. Não seria a autoridade uma resistência ao uso da violência? Não é a autoridade uma genuína forma de assegurar o cuidado de si e com o outro? Não é a autoridade uma prática de liberdade? Vou seguindo a linha de Foucault, tentando ver as coisas de uma forma diferente...

Mas isto é tema para uma outra postagem!

segunda-feira, 10 de agosto de 2009

domingo, 9 de agosto de 2009

Certeau e Foucault: pensadores do nosso tempo


Certeau faz uma inversão em relação as nossas formas usuais de ver o cotidiano e o homem ordinário (o homem comum). Para ele, o cotidiano é o espaço e o tempo do que é vivido. Esse cotidiano tem seu caráter de previsibilidade quanto ao que fazer, mas o como fazer, de acordo com Certeau, é inventividade - é a arte do fraco, que “tira proveito de forças que lhes são estranhas. No lugar do discurso, apresenta a decisão, o ato”. As estratégias – o “discurso”, a arte do forte – vem do alto e de fora, “de um sujeito de querer e poder”, e podem se traduzir em produtos, como normas, leis, discursos, livros, propagandas. Mas Certeau alerta para o fato de que, uma vez produzidos, pode-se dizer que ocorre a sua morte, e que a vida se dá no consumo que o homem ordinário faz desses produtos. Ele faz também uma nova inversão ao ver o homem comum como consumidor ativo, quase que um novo autor dos mesmos produtos. A tradução que o homem comum faz é fruto da inventividade presente no cotidiano – a arte do fraco – e é essa a tática do homem ordinário para conviver com a estratégia que vem de um lugar de poder distante e impessoal.[1]
E o que ambos - Foucault e Certeau - tem em comum?
A ousadia tranquila de ver o mesmo que todos, de uma forma diferente. E, ainda assim, serem de uma obviedade incontestável. Mudaram o rumo, foram na contra-mão. É uma boa idéia!

[1] [1] Resumo apresentado em abril/2009, como exigência da disciplina de Questões Atuais da Educação, ministrada pelo Professor Dr. Carlos Eduardo Ferraço. Grupo: Adriana, Alfredo, Ana Paula, Cynthia, Claudenice e Denise
Imagem: Cotidiano em Santo Antonio, de José Pereira

Sorria, você está sendo controlado

sexta-feira, 7 de agosto de 2009

Por que tanta dificuldade em entender Foucault?






















Da sua própria inquietaçao ele fez perguntas, das perguntas fez pesquisas, das pesquisas fez filosofia! Revirou-se, o tempo todo.

quinta-feira, 6 de agosto de 2009

Biografia




Pedido dele: "Não me pergunte quem sou, e não me diga para permanecer o mesmo"



O filósofo que se atreveu a tudo
Daniel Molina



El filósofo que se atrevió a todo. Publicado en Buenos Aires: Clarín, Sección “Cultura Y Nacion” en 25 de abril de 1999. Tradução de Wanderson Flor do Nascimento.



Quando morreu, em 25 de junho de 1984, Michel Foucault era o pensador mais famoso do mundo. Ainda que fosse algo menos popular do que havia conseguido ser Jean-Paul Sartre depois da Segunda Guerra Mundial, desde os fins dos anos 60 sua obra ocupou o lugar central. Michel Foucault morreu aos 57 anos: tinha aids em uma época em que a doença era rapidamente mortal. O vírus havia sido descoberto, apenas dois anos antes que o filósofo morresse, por Luc Montagnier, um pesquisador que foi discípulo do Dr. Paul Foucault, pai de Michel.

Filho, neto e bisneto de médicos, não foi fácil para Michel dizer a seu pai que não iria continuar a tradição familiar. Aos onze anos surpreendeu os mais velhos – que davam por certo que ele seria cirurgião ­– quando anunciou que queria ser professor de história. Apesar de tal atrevimento infantil, Foucault manteve durante toda a sua vida uma relação privilegiada com a medicina, ainda que fosse uma relação marcada por uma desconfiança essencial.

Desde muito pequeno, o filósofo conheceu o sofrimento. Sabia-se diferente e seu entorno lhe demonstrava de mil maneiras que isso não estava bem. Criado em um lar onde a forte tradição católica de linhagem paterna regia até os mínimos detalhes da vida cotidiana, membro da puritana classe média provincial das décadas de 30 e de 40, o rapazinho havia descoberto que – diferentemente do que dizia a maioria de seus companheiros – ele se sentia atraído por homens. A descoberta tornou-se uma tortura: não sabia o que fazer, a quem recorrer, como viver. Em sua casa, as pressões para que o menino se “endireitasse” deviam ser intoleráveis. O filósofo contou, pouco antes de morrer, que quando pequeno, seu pai o levou a uma das salas de cirurgia a fim de que o pequeno “se fizesse homem”. A vida para ele se tornou uma tortura: até meados de seus vinte anos, Foucault tentou várias vezes o suicídio e sua afeição pelo álcool nasceu nesta época. Contudo, ter sobrevivido ao escândalo de ser um adolescente homossexual em um mundo que considerava que esta orientação sexual era uma doença ou uma forma de degeneração moral, ter sido capaz de superar semelhante censura, o acostumou ao risco, o fortaleceu e o capacitou para intervir nos combates intelectuais que o esperavam, não menos ferozes que as cruéis brincadeiras e os brutais sarcasmos que teve de enfrentar em seus anos de estudante.

Foucault aprendeu desde muito cedo a enfrentar as questões desde um lugar absolutamente original. Nas disputas que a esquerda e a direita mantinham durante os quentes anos da Guerra Fria, mesmo que alinhado com a esquerda (inclusive, ingressou no Partido Comunista, seguindo seu amigo Louis Althusser), sua posição estava tão longe de ser ortodoxa que não foi estranho a ninguém que ele deixasse o comunismo tão rapidamente como havia ingressado. Nunca foi um esquerdista típico; suas posições políticas escandalizaram tanto aos conservadores quanto aos progressistas. Brilhante em uma geração de homens brilhantes (entre muitos companheiros de estudos destacavam-se Pierre Bourdieu e Paul Vayne, entre seus amigos figuram Pierre Boulez, Roland Barthes e Gilles Deleuze), Foucault sobressaiu-se desde o começo de sua carreira universitária. Seus professores (Maurice Merleau-Ponty, Georges Dumézil, Louis Althusser, Jean Hyppolite, Georges Canguilhem) acreditavam, desde que o conheceram, que ele era “a promessa de sua geração”.

Ainda menino, estava obcecado por ocupar os primeiros lugares no estudo. Em Poitiers, somente era superado por um colega cujo nome parece uma brincadeira do destino: Pierre Rivière (mesmo nome do assassino que escreveu as famosas memórias que Foucault analisou em Eu, Pierre Rivière, que degolei minha mãe, minha irmã e meu irmão). Uma das recordações mais amargas de sua adolescência está relacionada com a luta pela primazia na escola. O jovenzinho Michel viu chegar, de golpe - em plena invasão alemã – rapazes judeus que escapavam de Paris, então ocupada pelos nazistas. Os jovens parisienses tinham, obviamente, uma melhor formação do que os jovens de Poitiers, e por conseguinte, superaram a Michel. Ele detestou tanto esta situação que se fechou em uma fantasia que não o abandonou: nela, os parisienses “desapareciam”, eram seqüestrados e deportados de Poitiers. Esta fantasia se fez realidade rapidamente: os jovens judeus forram enviados aos campos de concentração. O adulto e iconoclasta Michel Foucault ainda sentia que tinha alguma culpa pela forma com a qual a história realizou o seu desejo.

A beatriz de Foucault foi Nietzsche. Como Beatriz guia Dante na Divina Comédia, a obra de Friedrich Nietzsche (especialmente os textos que ele escreveu quase à beira da loucura) foi para Foucault uma iluminação. Quase como nenhum dos especialistas em Nietzsche (nem mesmo pensadores tão sutis como Giorgio Colli) Foucault soube ver no autor do Nascimento da Tragédia tanto o poeta quanto o filósofo, o artista quanto o pensador. Para Foucault (como para Nietzsche) a forma, o tom poético que percorre sua escritura e o apelo ao aforismo nunca foram questões secundárias. Nietzsche também lhe permitiu sentir-se mais seguro para elaborar seu ponto de vista singular.

Como costuma acontecer com muitos jovens que se sentem incômodos em função de sua posição de estranho às normas e aos estilos que definem ao grupo que “pertence”, também para Foucault a obra de Nietzsche revelou o poder e o gozo de ser diferente. Esta obra foi o seu guia e sua sustentação; ajudou-o a compreender que ter um ponto de vista original não era um pecado pelo qual se devesse pagar caro. Há um par de aforismos nietzscheanos que o acompanharam por toda a vida quase como mantras para uma meditação pessoal. Um desses aforismos (o que, segundo o filósofo francês, marcou cada momento de sua vida) ele o parafraseava assim: “Trata-se de chegar a ser o que se verdadeiramente é”. O outro diz o seguinte: “O amor à verdade é terrível e poderoso”.

Entre as influências que o próprio Foucault considerou essenciais para sua formação se destacam Martin Heidegger e Jean-Paul Sartre (com quem se enfrentou mais de uma vez e de uma maneira tão dura, que levou muito tempo para reconhecer a dívida que tinha com sua obra). Não é casual que Sartre seja dramaturgo e novelista, além de filósofo. Como Roland Barthes, Foucault apreciava sem discussão a obra literária de Sartre. Tampouco é casual que Heidegger seja um dos poucos filósofos que fundou grande parte de sua reflexão sobre a poesia, à qual considerava uma potência reveladora.

O ponto de vista original que caracteriza a indagação foucaultiana, seu olhar pouco habitual no mundo do pensamento é, contudo, freqüente no universo da literatura. Se poderia dizer que Foucault é o mais literário dos filósofos e o mais filosófico dos escritores. Muitas de suas referências “teóricas” são literárias. Não é acidental, por exemplo, que no começo de As palavras e as coisas, diga que a pesquisa deste livro que o impulsionou à fama (inclusive à popularidade) nasceu de um fragmento de um dos ensaios de Jorge Luis Borges que se encontra em Outras inquisições: “O idioma analítico de John Wilkins”. Borges (da mesma forma que seu admirado Oscar Wilde) era um mestre na difícil arte de expressar idéias extremamente complexas e perigosas mediante paradoxos brilhantes e sutilezas estilísticas.

O estilo de Foucault (mas o estilo não é secundário, “o estilo é o homem”) é literário: desde a inclusão de multinarrações que são essenciais para o desenvolvimento do argumento até o trabalho com a escritura (uma escritura que abunda em metáforas, uma escritura que apela a transformar muitas de suas frases em epigramas, quase em versos e seus parágrafos em aforismos) fazem de Foucault um escritor, antes de um pensador.

O menino que decidiu ser professor de história se transformou em um dos escritores que mais profundamente refletiram sobre a história, um poeta do pensamento e um narrador teórico. Sua tese de titulação principal (apresentou duas; a segunda intitulada L'Anthropologie de Kant – Introdução, tradução e notas – não editada) foi apresentada em 1961, por Georges Canguilhem e D. Lagache: era a História da Loucura. Apenas lançado, o livro foi saudado como uma contribuição essencial para a história das mentalidades por historiadores da estatura de Fernand Braudel. A raiz deste texto começa uma série de programas de rádio dedicados a “história da loucura e literatura” que se mantêm no ar quase um ano.

A História da Loucura o transforma em um pensador de moda no meio intelectual francês. O jornal Le monde o qualifica como um “intelectual absoluto, fora do tempo”. Neste livro fundacional, Foucault insiste em pensar a loucura em sua especificidade, não como uma essência imutável que se manteria através do tempo e as culturas (só mudariam as formas de designá-la), mas que é própria de cada momento histórico, de cada contexto cultural, social e econômico. Enquanto, mais precisamente, é definida desde o ponto de vista da ciência, a loucura se torna cada vez mais inapreensível. Contudo, seu flanco politicamente explosivo logo se porá em manifesto por meio do Maio[1] Francês, quando Foucault se relaciona com os antipsiquiatras, Ronald Laing e David Cooper e com os que criticam a reclusão em manicômio, como Basaglia. Nos fins deste ano, Foucault termina de escrever O nascimento da clínica (livro que ele apresenta como “as sobras da História da Loucura”), que aparecerá dois anos mais tarde. A medicina – vista a partir da crítica mais virulenta contra o saber médico – segue ocupando um lugar central em seu pensamento. Diferentemente dos que criticam a medicina moderna por seus erros (pelos efeitos colaterais que têm os medicamentos ou pelos diagnósticos errados), Foucault critica a medicina em sua “essência”: o saber médico é negativo por si mesmo, sobretudo quando acerta, porque sua mecânica destrutiva – ver a doença como algo a combater – cria as condições de novas enfermidades, que serão mais difíceis de controlar.

Em 1966 aparece seu livro mais difundido, As palavras e as coisas. A conclusão do ensaio contribuiu para que a imprensa lançasse uma polêmica (que para Foucault – como para muitos outros intelectuais – é uma discussão fundamentalmente “midiática”) que ocupou durante meses as páginas dos principais jornais franceses: a muito mal entendida questão do que se chamou “a morte do homem”. Foucault, que estava interessando em desmontar o mecanismo de naturalização do pensamento (um mecanismo que faz com que se acredite que os conceitos, assim como também os problemas e as soluções científicas, são eternos – ou quase – porque o pensamento é visto como se estivesse fora da história), escreveu, como conclusão de sua investigação: “Uma coisa em todo caso é certa: é que o homem não é o mais velho e nem o mais constante problema que se tenha colocado ao saber humano (...) O homem é uma invenção cuja recente data a arqueologia de nosso pensamento mostra facilmente. E talvez o fim próximo. Se estas disposições viessem a desaparecer tal como apareceram, se, por algum acontecimento de que podemos quando muito pressentir a possibilidade, mas de que nosso momento não conhecemos ainda nem a forma nem a promessa, se desvanecessem, como aconteceu, na curva do séc. XVIII, como solo do pensamento clássico – então se pode apostar que o homem se desvaneceria, como, na orla do mar, um rosto de areia”.

Nos apaixonados dias do Maio francês, o pensador se encontrava entre dois continentes (Europa e África) e, alem disso, nadando entre duas águas: poucas horas antes da sublevação estudantil Foucault é um acadêmico de prestígio, um professor querido, mas “elitista”, um homem que está discutindo com o governo o futuro da educação secundária e universitária da França. É um homem que “renegou” Marx. A maioria da esquerda o qualifica de “violentamente anticomunista”. Realiza cursos na Tunísia ao mesmo tempo em que é nomeado professor da universidade de Nanterre, que será uma das trincheiras mais ardentes durante a revolta estudantil. Durante quase todo Maio, Foucault permanece bloqueado em Tunísia; logo pode tomar um vôo a Paris no dia 27. Chega justo para somar-se ao motim dos líderes da esquerda que se realizou no estádio Charléty. Com idas e voltas a Tunísia, Foucault participa das últimas manifestações francesas, antes que o partido de De Gaulle ganhe amplamente as eleições convocadas por Pompidou. Foucault declara que as revoltas hiperideologizadas dos estudantes franceses não lhe interessam tanto. Acrescenta que, pelo contrário, “a militância violenta, corporal e necessária” dos tunisienses o fez redescobrir a amor à militância.

Poucos dias depois de acabada a revolta, Hélène Cixous o convida para participar da criação da universidade de Vincennes. Mesmo que o tenha convocado para dirigir o projeto, Foucault só aceita ajudar a estruturar os departamentos de psicanálise (em conjunto com o lacaniano Serge Leclaire) e de filosofia (junto com Alan Badiou). Enquanto os intelectuais soviéticos - Na revista Literatounæ Gazeta – atacam duramente o “antimarxismo e anti-humanismo” de Foucault, o novo ministro da educação da França, Olivier Guichard, não o concedeu validade nacional à licenciatura outorgada por Vincennes (onde o pensador ensinava) porque “têm muitos cursos dedicados à política e ao marxismo”.

Nos começos de 1970 Foucault realizava a sua primeira viagem aos Estados Unidos. A partir dali, conquistará o mundo intelectual. Ao mesmo tempo em que chega a Berkeley, às experiências com as drogas – de maneira muito tímida – e às práticas sexuais sado-masoquistas – não tão timidamente – Foucault começa a enfocar seu trabalho sobre o problema do poder e da relação entre o saber e poder. Em resposta a um longo artigo que Althusser publicou em La Pensée, no qual os aparelhos de estado se diferencia segundo funcionem pela violência ou pela ideologia, Foucault escreve um artigo que critica esta distinção. É a origem de outro de seus livros mais difundidos: Vigiar e punir, que verá a luz cinco anos depois. Ao mesmo tempo, funda o Grupo de Informação sobre as Prisões (GIP), como forma de intervenção específica sobre a realidade. É nesta época que Foucault escreve sobre as prisões. Pergunta-se por que as prisões, apesar de conter uma população minoritária, exercem tal fascinação social. Ele crê que as prisões fascinam porque permitem aos “bons, aos cidadãos irrepreensíveis”, aos que se consideram socialmente “inocentes” exercer o mal sem limites: “Todas as violências e arbitrariedades são possíveis na prisão, mesmo que a lei diga o contrário, porque a sociedade não só tolera, mas exige que o delinqüente sofra”.

Em sua aula inaugural do Collège de France, em 02 de dezembro de 1970, Foucault expõe sobre a questão do poder. Durante 13 anos, cada quarta feira, às 17:45h exporá suas pesquisas. O tema do primeiro curso, intitulado “A vontade de saber”, é a contraposição dos modelos teóricos de Aristóteles e Nietzsche. A concorrência foi tão massiva que não sabiam onde colocar tanta gente. Foucault começa um período de abertura a todos os temas, a todas as formas de abordagem: os anos de 1970 serão de intensa aprendizagem e de elaboração apaixonada. Ao regressar de sua viagem ao Irã (ainda governado pelo sha) em 1977, dirá uma de suas frases mais difundidas e, quem sabe, menos entendidas: “Há mais idéias no mundo que as que imaginam os intelectuais”. A experiência californiana que viveu durante seus últimos dez anos de vida foi essencial. Em Berkeley ensinou (e pesquisou). Nas saunas gays de Los Angeles acedeu a práticas sado-masoquistas que, mais que subjugá-lo, o permitiram desenvolver uma reflexão original sobre o gozo por meio da dor (é o Foucault mais intenso e menos difundido nas universidades). Apesar de que seu interesse pela sexualidade possa parecer óbvio (interesse refletido em sua última obra, os três tomos da História da sexualidade), o enfoque que Foucault dá a questão, não o é. Para o próprio filósofo, foi um problema chegar a pensar o sexual. Quando em seus anos universitários o deram como tema de investigação filosófica “a sexualidade”, Foucault se aborreceu com Canguilhem por propor “algo assim como objeto da filosofia”. Pelo contrário, depois de percorrer um longo caminho, em suas investigações dos anos 1970, ele pergunta, em primeiro lugar, por que a sexualidade é objeto de uma preocupação moral (e já a pergunta desarma a “naturalidade” da questão, já deixa de ser óbvio que o sexo é um problema moral: está claro que alguém, alguma instituição, um poder necessita que o sexo seja supervisionado pela moral).

Sua obra foi se aproximando a seu ideal de vida: chegar a ser o que verdadeiramente se é. Ao mesmo tempo em que o sério Foucault – o que havia negado a importância da vida para a obra – foi capaz de ir deixando de lado seus próprios temores e se atreveu a manifestar-se, começou a importar-lhe não só para quem fala, mas como se vive uma experiência. Isto iluminou sua obra. Sua filosofia transformou-se naquilo que Sartre desejou produzir mas não chegou a articular: uma ética. A ética de Foucault nasceu quando, em sua reflexão, encontrou-se com seus mestres: os antigos gregos. Esta intensidade final, nascida do risco, outorga a sua obra uma consistência clássica. Talvez por isso suas idéias não pareceram correr o risco de desvanecer-se como um rosto de areia na beira do mar.
__________________
[1] Referência à revolta estudantil ocorrida em Paris em maio de 1968 (N. do T.)






Veja mais sobre Foucault em As Histórias de Michel de Foucault, disponível em http://www.klepsidra.net/klepsidra12/foucault.html







A tragédia grega




Foucault resgata o pensamento de Nietzsche, quando trata das questões morais. Ambos afirmam que mais do que um código de conduta criado por outros homens, deveríamos pautar nossa conduta por escolhas pessoais. Foucault avança em relação a Nietzsche, porque ele fala do cuidado de si para o cuidado com o outro também, como está no vídeo com esse tema, já postado no blog.
Mas ambos retomam à antiquidade para falar sobre a moral antiga e a moral moderna, e falam sobre a tragédia grega. É essa história que quero contar hoje:





O culto a Dioniso
(educaterra.terra.com.br/.../tragedia_grega3.htm)


Etimologicamente "Dionísio" significa o filho de Zeus (os romanos chamaram-no de Baco). Na época da colheita as comunidades rurais dedicavam ao deus festivo, cinco dias de folias ungidas com muito vinho, até provocar a embriaguez coletiva. Durante as bacantes, isto é, as festas dionisíacas, ninguém poderia ser detido e aqueles que estivessem presos eram libertados para participarem da festança geral.

Acredita-se que sua origem primeira veio da Trácia, sendo que as mulheres daquela região da Grécia foram suas principais adoradoras. Embriagadas ou simulando encontraram-se "possuídas", endemoninhadas, lançando sobre si cinzas e pó, as seguidoras de Dionísio refugiavam-se em locais ermos para, em contato com o ar livre e a natureza selvática, exorcizar a "possessão". [...] A origem psico-sociológica desse comportamento não foi ainda suficientemente avaliada, mas pode-se supor que derivasse de uma reação patológica à exclusão cada vez maior das mulheres da vida coletiva.

O atingido por tal loucura, excluídas as circunstâncias exteriores capazes de provocarem o fenômeno, via estranhas figuras, ouvia o som de flautas e caia num profundo paroxismo, sendo atacado por um furor irresistível de dançar. Portanto, o culto dionisíaco conservou, como um componente essencial, essas explosões imprevisíveis, anárquicas e passionais, que fizeram com que Nietzsche as identificasse como as autenticas manifestações de uma vitalidade aprisionada pela moral, pelo preconceito e pela razão.

Eles procuram um caminho de volta ao útero do ser – uma fuga da prisão do eu. Essa condição de transe nos protege brevemente de nosso sentido de isolamento e da natureza transitória da vida humana, da qual nossa intuição não nos permite escapar. (Nietzsche)
Apolo, o deus símbolo da racionalidade, da beleza e da inteligência, estendeu finalmente seus braços para Dionísio. Transpondo tal esquematização para a encenação teatral podemos afirmar que a Tragédia, como espetáculo, era a domesticação apolínea dos desregramentos de Dionísio. O Consciente dominando o Inconsciente; o Racional subordinando o Temerário; o Sol desvelando a Treva. Ao reproduzir frente ao público o inesperado, o passional, imaginava-se conter Dionísio, domesticando-o. Por isso entende-se a observação de Nietzsche que afirmou que os gregos foram obrigados a erguer dois altares na encenação teatral: um para Apolo e o outro a Dionísio.

O espírito dionisíaco é reprimido e permanecemos separados da intuição sensual e da verdade espiritual. O mito trágico se perdeu. (Nietzsche)

Imagem: http://3.bp.blogspot.com/





terça-feira, 4 de agosto de 2009

Foucault e a loucura

Filho de uma família de médicos, quis ser professor (uma loucura!). Homosexual, foi tratado pelo pai médico como um doente que podia ser curado, ou "consertado". Morreu de AIDS no auge do preconceito contra a doença, identificada como doença de gays. Teve depressão. Conheceu, enfim, e de perto, a violência de um ser humano sobre o Outro, na vida cotidiana.

Ele não concebia como um ser humano poderia ter tanto poder em relação a Outro a ponto de interná-lo como um louco num hospício, e esquecê-lo lá, o resto de sua vida... E como a medicina conseguia tratar a questão dessa forma, também com tanta violência.

Em sua primeira fase, dedicou boa parte da vida ao estudo das condições da loucura. A autora deste vídeo captou essa fase de Foucault com conhecimento e imaginação. Ficou simples e bonito. (créditos ao final do filme)

segunda-feira, 3 de agosto de 2009

Por que gosto de Foucault?


Alguns autores nos apaixonam. Eles conseguem dizer o que a gente sente e pensa, de uma forma infinitamente mais bonita!
Segue um pequeno resumo de um capítulo do livro citado abaixo:


Larrosa afirma crer no poder das palavras, na sua força, na possibilidade de fazermos coisas com elas e de elas fazerem coisas conosco. Ele afirma que todo homem é palavra, que o homem é como palavra, que todo humano tem a ver com a palavra, dáse em palavra, está tecido de palavras...
Experiência é o que nos passa, nos acontece ou nos toca. Larrosa afirma que a experiência nos é cada vez mais rara! O primeiro motivo é que convivemos com o excesso de informação. Um segundo motivo para a ausência da experiência é o excesso de opinião. O sujeito obcecado pela informação, sem que ela verdadeiramente lhe toque, sente-se obrigado a opinar sobre tudo. Em terceiro lugar, ele fala da falta de tempo. A correria faz com que necessitemos correr, responder a tudo com velocidade, e, permanentemente excitados, tornamo-nos
incapazes do silêncio. A falta de silêncio e de memória são também inimigas mortais da experiência. Em quarto lugar, ele fala que a ausência da experiência se dá também pelo excesso de trabalho. Para Larrosa, é incapaz de experiência quem não se expõe, ainda que isso traga vulnerabilidade e risco. E afirma que se a experiência é o que nos acontece e se o sujeito da experiência é um território de passagem, então a experiência é uma paixão.



LARROSA, Jorge. Linguagem e educação depois de Babel. Belo Horizonte: Autêntica, 2004. Resumo de capítulo.


Não é maravilhoso o que ele diz?

Mas o blog é sobre Foucault, voltemos a ele!
Imagem: nemtudooquesobe.blogspot...

domingo, 2 de agosto de 2009

Preliminares









Uma estética da existência
Entrevista com Michel de Foucault
– Em um texto publicado em O Debate de novembro de 1983, você fala, em respeito da Antigüidade, de morais voltadas para a ética e de morais voltadas para o código. É esta mesma distinção entre a moral greco-romana e a que vai nascer com o cristianismo?


– Com o cristianismo, veio a se instaurar lentamente, progressivamente uma mudança em relação às morais antigas, que eram, essencialmente, uma prática, um estilo de liberdade. Naturalmente, havia também certas normas de comportamento que regulavam a conduta de cada um. Porém, a vontade de ser um sujeito moral e a procura de uma ética da existência era principalmente, na Antiguidade, um esforço para afirmar a própria liberdade e dar a sua própria vida uma certa forma na qual podia se reconhecer e ser reconhecido por outros e onde a posteridade mesma poderia encontrar como exemplo.

FOUCAULT, Michel. Dits et écrits. Paris: Gallimard, 1994, Vol. IV, pp. 730-735.
Tradução: Wanderson F. Nascimento


A lei de Deus e, posteriormente, a norma das ciências, ocupou por muitos séculos a morada de nossas próprias decisões e de nosso destinar no mundo. Aprendemos a delegar a intransferibilidade de nossa história ao conhecimento e cuidado de que os outros julgam e assim destinam ser quem somos, não pela experiência de se tornar quem se é pelo brilho público das ações e pelas escolhas dos afazeres, mas pela identidade do que não se pode evitar (ainda que se esconda) quando a lei de um saber vigora sobre a constituição de um caráter [...]


SILVA, Jason de Lima e. Foucault além de Nietzsche: da moral como lei e norma à avaliação da moral como ética e estética da existência. Tese de Doutoramento. Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul. Centro de Filosofia e Ciências Humanas. Programa de Pós-Graduação em Filosofia. Orientador: Prof. Dr. Nythamar Fernandes de Oliveira. Porto Alegre, 2007. p.140-141


Se levarmos em conta que para Foucault a ética é um modo de relacionamento do indivíduo consigo mesmo (conf. Foucault, 1984: 219) a questão que se coloca é eminentemente prática. Não se trata de investigar o que, de propor um fundamento que volte a legitimar um código (ainda que mínimo); mas de perguntar-se pelo como, do como se constitui o indivíduo como sujeito moral de suas ações. O como introduz a variabilidade, a transformação possível, a diversidade.

Investigar o como conduz a encontrarse com o fato de que o fundamento é móvel e altamente transformável (Foucault demonstrou essa tese tanto para o âmbito do conhecimento, como para o político e moral nos seus livros mais célebres). Perguntar pelo como em relação à constituição do indivíduo como sujeito de suas ações supõe aceitar a variabilidade e a diversidade, pensar a ética como criação de e a partir da liberdade e pensar o sujeito como obra, obra de si mesmo, obra de arte. (grifos nossos)


NASCIMENTO, Wanderson Flor do. Nos rastros de Foucault: ética e subjetivação. Disponível em http://www.unb.br/fe/tef/filoesco/foucault/art02.html Acesso em 01/05/2009.

Créditos:

Imagem Ética: eduhonorato.wordpress.com
Imagem cinco sentidos: blogit.com.br
Imagem Foucault: phillwebb.net